Alguns vinhos não precisam de artifícios para se fazerem notar. Bastam-lhes o lugar certo, a casta certa e um ano de equilíbrio entre natureza e conhecimento. O 1808 Tinta Roriz Beira Interior DOC Tinto é exatamente isso: um vinho que expressa a identidade mais honesta da casta Tinta Roriz, interpretada num dos seus contextos menos óbvios – mas talvez mais reveladores – o planalto granítico da Beira Interior.

Este vinho não procura encantar pela exuberância, mas pela autenticidade, estrutura e mineralidade que só a altitude e a contenção sabem proporcionar.

Um território de contrastes e carácter

A Beira Interior é, ainda hoje, uma das regiões menos compreendidas do panorama vitivinícola português. Distante dos centros urbanos e do circuito turístico convencional, é uma região de altitude, clima severo e solos pobres, onde as vinhas crescem longe dos holofotes, mas perto da verdade.

É nesta geografia que nasce o 1808 Tinta Roriz. Mais concretamente, na zona da Mêda, a cerca de 550 metros de altitude, onde os solos graníticos e arenosos obrigam a vinha a lutar por cada nutriente. Estas condições extremas reduzem naturalmente a produtividade e concentram a qualidade nos cachos.

O clima é outro fator determinante: invernos longos e frios, verões secos mas com noites frescas, e uma grande amplitude térmica que permite preservar a acidez natural das uvas. É esse o segredo para produzir um Tinta Roriz que desafia os estereótipos da casta – mais conhecida por sua estrutura e rusticidade – e revela aqui um lado mais fino, mineral e preciso.

A casta Tinta Roriz sob outra luz

A Tinta Roriz (ou Tempranillo, como é conhecida em Espanha) é uma casta nobre do universo ibérico. No Douro, traz corpo e estrutura a muitos lotes, e em regiões mais quentes tende a expressar notas de fruta vermelha, chocolate e taninos marcados.

Mas na Beira Interior, e sobretudo neste vinho, o objetivo é outro: mostrar a casta com menos peso, mais nervo e maior frescura, revelando o que ela pode oferecer quando plantada em altitude e vinificada com contenção.

Aqui, a Tinta Roriz mostra-se com fruta vermelha mais nítida, especiarias finas, acidez vibrante e uma textura firme mas elegante. É uma versão mais precisa e mais gastronómica da casta – talvez menos consensual, mas profundamente cativante para quem procura identidade.

Vinificaçã0: miníma intervenção, máxima expressão

O 1808 Tinta Roriz é vinificado com um princípio claro: intervir o mínimo necessário para que a vinha se revele no copo.

A colheita é feita na última semana de setembro, de forma mecanizada, garantindo rapidez e preservação da frescura. As uvas são desengaçadas e suavemente esmagadas, seguindo-se uma maceração pré-fermentativa a frio durante 3 dias, que permite extrair cor e compostos aromáticos de forma delicada.

A fermentação alcoólica, começou a 12ºC e terminando a 32ºC, num processo controlado. Um dos detalhes mais importantes desta vinificação: não é adicionado qualquer sulfuroso até ao dia do engarrafamento, o que exige maior rigor no acompanhamento, mas permite preservar a integridade natural da casta.

A fermentação malolática terminou ao mesmo tempo da alcoólica, Após fez estágio de 12 meses em madeira de carvalho francês  – sempre com o objetivo de respeitar o equilíbrio entre tensão e corpo.

O vinho é filtrado e estabilizado antes do engarrafamento, assegurando longevidade e consistência sem comprometer a autenticidade.

Notas de Prova

No copo, o 1808 Tinta Roriz Beira Interior Tinto 2023 apresenta-se com cor rubi intensa, de reflexos vivos.

O nariz é direto e limpo, com aromas de fruta vermelha fresca – cereja, groselha, romã – acompanhados por notas de especiaria fina, pimenta preta e um leve toque terroso, quase mineral, que denuncia o solo granítico.

Na boca, o vinho mostra-se com entrada firme, taninos bem definidos e acidez viva. Há nervo, há verticalidade, mas também uma sensação de pureza que o torna apetecível e profundamente gastronómico. O final é seco, persistente, com um eco mineral que convida a outro gole – ou a outro prato.

Este é um tinto que pede comida. E mais do que isso: eleva a experiência gastronómica, pela sua estrutura e frescura.

Combina maravilhosamente com enchidos artesanais, carnes grelhadas, borrego no forno, queijos de pasta dura e pratos de caça ligeira, mas também com pratos mais modernos, como um naco de atum braseado, cogumelos silvestres salteados ou uma bochecha de porco confitada.

É um vinho que gosta de contrastes – da gordura com a acidez, da rusticidade com a tensão.

Conclusão: um vinho com origem, rigor e verdade

O 1808 Tinta Roriz Beira Interior DOC Tinto não pretende ser um blockbuster. Não é um vinho de óbvia sedução. É, sim, um vinho honesto, técnico e autêntico, que prova como a casta Tinta Roriz pode brilhar em contextos menos óbvios e dar origem a tintos de enorme caráter.

Num tempo em que muitos vinhos procuram ser tudo para todos, este escolhe ser fiel à sua origem. E é por isso que merece atenção. Porque é no detalhe, na altitude, na contenção e na precisão que ele revela a sua grandeza.

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